Negociações por cessar-fogo em Gaza estão paralisadas por intransigência de Israel
Mediadores acusam Israel de travar diálogos com o Hamas e protelar acordo de libertação de prisioneiros e cessar-fogo
247 - O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, deixou a Casa Branca nesta terça-feira (8) após uma reunião com o presidente dos EUA, Donald Trump, sem qualquer anúncio público de progresso nas negociações sobre o cessar-fogo na Faixa de Gaza e a libertação de prisioneiros. Foi o segundo encontro entre os dois líderes em menos de uma semana, evidenciando a gravidade da crise, mas também a estagnação das conversas.
A ausência de avanços ficou ainda mais evidente com a decisão do enviado especial dos EUA para o Oriente Médio, Steve Witkoff, de adiar sua viagem a Doha, no Catar, onde as negociações indiretas entre Israel e Hamas vinham sendo conduzidas. Segundo fontes ouvidas pelo Times of Israel, a decisão revela que “ainda há muito progresso a ser feito”.
De acordo com o jornal saudita Asharq News, que cita fontes palestinas e árabes envolvidas no processo, a quinta rodada de negociações terminou sem progresso. Uma autoridade palestina acusou diretamente a delegação israelense de “não negociar de fato, apenas escutar” e de consultar Netanyahu e o ministro de Assuntos Estratégicos, Ron Dermer, sobre todas as questões. “A equipe israelense não tem autoridade para tomar decisões reais, o que demonstra a política de obstrução de Netanyahu para evitar qualquer acordo potencial”, afirmou.
Antes da reunião com Trump, o próprio Witkoff havia expressado otimismo de que um acordo poderia ser alcançado ainda esta semana. Ele chegou a afirmar que três dos quatro principais pontos de discórdia já teriam sido superados. No entanto, os mediadores egípcios e catarianos mostraram-se muito mais céticos.
O principal ponto de impasse diz respeito à retirada parcial do exército de ocupação de Israel durante o período de trégua de 60 dias. O governo israelense insiste em manter suas tropas no Corredor Morag, no sul de Gaza, justamente onde pretende instalar uma chamada “cidade humanitária”, local em que mais de 2 milhões de palestinos seriam confinados e impedidos de sair.
A proposta, anunciada pelo ministro da Defesa, Israel Katz, gerou forte reação internacional. Fontes palestinas disseram à emissora pública israelense Kan que os comentários de Katz endureceram a posição do Hamas em relação à retirada israelense e prejudicaram as negociações em Doha.
Mesmo com os desdobramentos negativos, Netanyahu afirmou após o encontro com Trump que “não vamos desistir nem por um instante” dos esforços para libertar os prisioneiros. Em um vídeo gravado na Blair House, o premiê reiterou os objetivos de Israel em Gaza: “a libertação de todos os nossos reféns, vivos e mortos; a eliminação das capacidades militares e governamentais do Hamas; e garantir que Gaza não represente mais uma ameaça a Israel”.
A postura inflexível do governo israelense também tem provocado desconfiança dos mediadores quanto à possibilidade de um acordo viável. Enquanto os EUA ofereceram ao Hamas uma garantia verbal de que a trégua temporária permaneceria em vigor mesmo sem um cessar-fogo permanente, o grupo palestino exige garantias formais e escritas. A experiência recente contribui para a desconfiança: segundo uma autoridade palestina, o Hamas já havia recebido promessas semelhantes antes da libertação do refém Edan Alexander, sem que houvesse pressão subsequente de Washington para o fim da guerra.
Outro ponto ainda não resolvido diz respeito à identificação dos prisioneiros que seriam libertados. Witkoff sugeriu que essa questão estaria entre as já resolvidas, mas fontes afirmam que ela sequer foi discutida nas conversas em Doha.
Durante a reunião com Trump, Netanyahu também tratou da recente operação conjunta com os EUA contra o Irã e falou sobre os Acordos de Abraão. “Estamos trabalhando com todo o vigor para expandir o círculo de paz”, disse ele.
Horas antes da reunião, Netanyahu esteve no Capitólio dos EUA, onde se encontrou com o presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson. Ao ser questionado sobre o fim da guerra, reiterou sua posição: “Pretendemos que o Hamas não controle a região. Faremos o que for necessário para que isso aconteça”.
Netanyahu ainda foi além: “Estamos preparados para encerrar a guerra — sob as condições de que o Hamas não possa mais agir, que não tenha mais capacidade de governança ou militar e que Gaza não possa representar uma ameaça a Israel”.
As falas do primeiro-ministro reforçam a percepção de que Israel busca impor um cessar-fogo em seus próprios termos, ignorando os pontos sensíveis para o Hamas e os apelos dos mediadores. Uma autoridade israelense chegou a reconhecer que a resposta do Hamas à última proposta fez as partes recuarem, e admitiu que “mais do que alguns dias” serão necessários para um eventual acordo.
Mesmo diante da insistência de Witkoff em manter o otimismo, diplomatas árabes ouvidos pelo Times of Israel avaliaram que as lacunas entre as partes são maiores do que as apresentadas publicamente. A posição de Netanyahu, de manter a pressão militar enquanto negocia, e de condicionar qualquer trégua à aniquilação do Hamas, torna improvável um avanço significativo a curto prazo.
O impasse diplomático se agrava no mesmo momento em que aumentam as perdas humanas. Nesta terça-feira, cinco soldados israelenses morreram em uma explosão no norte de Gaza, reacendendo questionamentos sobre os custos de prolongar o conflito.
Ainda que Netanyahu tenha destacado “nível de coordenação sem precedentes” com os EUA, a realidade no terreno e as queixas dos mediadores árabes apontam para uma estagnação nas tratativas, cuja responsabilidade recai, cada vez mais, sobre a rigidez do governo israelense.
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