“Trump está querendo enfraquecer o principal líder da esquerda mundial, que é o Brasil”, diz Mantega

247 – Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega classificou como "uma agressão política sem fundamento" o anúncio do ex-presidente norte-americano Donald Trump de taxar em até 50% produtos importados do Brasil. Para Mantega, a retaliação anunciada não tem racionalidade econômica e deve ser interpretada no contexto eleitoral dos EUA e da disputa geopolítica global.

“O Trump está querendo enfraquecer o principal líder da esquerda mundial, que é o Brasil”, afirmou Mantega. Para ele, o gesto tem como alvo direto o presidente Lula, que representa um contraponto à extrema-direita internacional. “Primeiro, o Lula é o principal líder da esquerda mundial. Segundo, ele lidera os BRICS, que vêm desafiando a hegemonia do dólar. Terceiro, o Brasil está criando leis para regular as Big Techs, o que incomoda muito a direita global”, explicou.

O ex-ministro defendeu uma resposta firme no campo político e diplomático, mas cautelosa na esfera econômica. “É prudência na área econômica e toda a ousadia e determinação na área política”, sintetizou. Ele acredita que medidas apressadas podem prejudicar setores estratégicos do Brasil, como a agricultura, que depende de insumos importados dos Estados Unidos, como fertilizantes.

Apesar da ameaça de tarifas, Mantega vê sinais de resiliência econômica. Ele destaca a estabilidade cambial, a tendência de valorização do real e a queda nos preços dos alimentos como fatores que não devem ser revertidos por esse episódio. “Nós tivemos deflação de alimentos, que é tudo o que nós queríamos. A população já está consumindo a preços menores”, pontuou.

Em relação ao mercado, Mantega chamou atenção para o uso especulativo da informação privilegiada no mercado de derivativos: “Alguém apostou que o dólar ia se valorizar e ganhou bastante dinheiro. O Banco Central deve estar investigando. Parece inside information”, sugeriu. Para ele, a oscilação do dólar foi menor do que o esperado, o que indica que o impacto real da medida ainda é limitado.

Sobre a possibilidade de o Brasil reorientar suas relações comerciais e se afastar dos EUA, como sugerido por alguns analistas, Mantega adotou um tom pragmático. “Eu não acho que devemos tomar medidas radicais por causa de um governo exótico como o de Trump. A diversificação já está em curso. Mas não é hora de romper com um parceiro tradicional”, afirmou.

Ele destacou que o episódio pode ter um efeito político positivo, ao unificar diferentes setores em defesa do interesse nacional. “Até o setor agrícola se manifestou contra a medida. Isso fortalece o governo. Pode ter o mesmo efeito que medidas similares do Trump tiveram no Canadá ou na Austrália: unir a população em torno do líder agredido”, avaliou.

Mantega também defendeu o uso de instrumentos jurídicos para reagir à atuação da família Bolsonaro, a quem acusou de cumplicidade com os ataques de Trump. “O filho do Bolsonaro está estimulando uma agressão contra o Brasil. Esse cidadão devia ser processado”, afirmou, referindo-se às declarações do deputado Eduardo Bolsonaro em Washington.

No final da entrevista, o ex-ministro reiterou que, embora o momento exija cautela, a postura brasileira não pode ser passiva. “Nossa soberania foi ameaçada. Isso merece uma resposta duríssima”, concluiu. Assista: