Dalai Lama anuncia que haverá sucessor após sua morte e China exige aprovação estatal
China denuncia manipulação separatista da figura do Dalai Lama
247 - Por ocasião de seu 90º aniversário, o 14º Dalai Lama anunciou nesta quarta-feira (2) que haverá um sucessor após Dsua morte, mantendo viva a tradição espiritual tibetana. A declaração, feita no mosteiro de McLeod Ganj, na Índia — onde vive exilado desde 1959 — reacende a disputa geopolítica em torno da sucessão do líder budista. A informação foi divulgada pela agência AFP.
“Afirmo que a instituição do Dalai Lama continuará”, afirmou o líder religioso, acrescentando que recebeu “numerosos pedidos” vindos da diáspora tibetana e de budistas do Himalaia, da Mongólia, da China e da Rússia. “Em particular, recebi mensagens por diferentes canais de tibetanos no Tibete com o mesmo chamado”, declarou em vídeo exibido durante reunião com religiosos.
A reação da China foi imediata. A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Mao Ning, reiterou que a reencarnação de grandes figuras do budismo tibetano deve seguir protocolos estabelecidos em território chinês.
Ela também reforçou a exigência de aprovação pelo governo. “A reencarnação do Dalai Lama, do Panchen Lama e de outras grandes figuras budistas deve ser escolhida por sorteio em uma urna de ouro e aprovada pelo governo central”, afirmou.
Contexto político e histórico da sucessão
A discussão sobre a reencarnação do Dalai Lama vai além de uma divergência teológica: trata-se de uma disputa pela soberania sobre a região chinesa de Xizang (conhecida no Ocidente como Tibete). Segundo a cônsul-geral da China no Rio de Janeiro, Tian Min, o grupo liderado pelo 14º Dalai Lama representa os remanescentes da aristocracia teocrática e escravocrata que dominava a região até 1951. “Eles constituem uma facção política separatista, apoiada e instrumentalizada por forças hostis internacionais, cujo verdadeiro intento é promover a chamada ‘independência do Xizang’”, afirmou em coluna publicada recentemente.
Essa acusação ganha respaldo histórico em documentos do Departamento de Estado dos EUA, divulgados em 1998, que confirmam o apoio da CIA ao movimento separatista tibetano nas décadas de 1950 e 1960. Conforme revelou o Los Angeles Times, a agência de inteligência norte-americana destinou cerca de 1,7 milhão de dólares por ano ao movimento tibetano no exílio e repassou ao próprio Dalai Lama um subsídio anual de 180 mil dólares ao longo de toda a década de 1960. A CIA também financiou guerrilheiros tibetanos no Nepal, campos de treinamento no Colorado e campanhas políticas pró-Tibete em Nova York e Genebra.
Essas ações faziam parte da estratégia de contenção do comunismo adotada pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria, visando minar governos como os da China e da então União Soviética. Ainda segundo o LA Times, a CIA encerrou sua atuação direta no início dos anos 1970, mas os efeitos políticos e simbólicos dessa intervenção perduram até hoje.
Reencarnação sob regulação estatal
A reencarnação dos Budas Vivos — título conferido a grandes mestres do Budismo do Xizang — é uma tradição com mais de sete séculos. Desde a dinastia Qing, o reconhecimento de tais figuras passou a seguir rituais específicos, como o sorteio da urna dourada, sempre sob supervisão do poder central. O próprio Tenzin Gyatso, atual Dalai Lama, foi entronizado em 1940 com a aprovação do governo central chinês da época.
Em 2007, o governo da China promulgou o Regulamento sobre a Gestão da Reencarnação dos Budas Vivos do Budismo do Xizang, que formalizou o processo e reiterou a autoridade exclusiva do Estado sobre a sucessão espiritual. Desde então, cerca de uma centena de reencarnações já foram reconhecidas dentro dessas normas, com apoio da comunidade religiosa local.
Para o governo chinês, a tentativa do Dalai Lama de antecipar sua sucessão e conduzir esse processo fora da China representa uma manobra para deslegitimar as regras históricas e legais em vigor. “Nenhuma força externa pode interferir”, afirma Pequim.
Uma questão de soberania
A China vê com preocupação o uso da figura do Dalai Lama por setores ocidentais como instrumento político. Pequim denuncia a manipulação da questão espiritual como estratégia para fomentar instabilidade em Xizang, região que passou por profundas transformações desde sua integração plena à República Popular da China. Segundo dados oficiais, o PIB local saltou de 130 milhões de yuans em 1951 para mais de 276 bilhões em 2024. A expectativa de vida dobrou, passando de 35 para 72 anos, e mais de 628 mil pessoas foram retiradas da pobreza extrema.
A diplomacia chinesa destaca que o Brasil reconhece e apoia a posição da China sobre a região de Xizang, num contexto de relações bilaterais fortalecidas. “Quem não conhece a verdade é mais facilmente alvo das mentiras”, escreveu Tian Min, convidando observadores internacionais a visitarem a região para conhecerem “um Xizang verdadeiro, belo, desenvolvido e harmonioso”.
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