Como evitar o mal maior: boicote do Congresso e risco de volta de bolsonaristas em 2026
Comunicando com o povo, organizando a base e entregando resultados, governo precisa reagir ao cerco institucional e barrar a ascensão da extrema direita
Nos últimos meses, tem se intensificado no Congresso Nacional um movimento de boicote sistemático ao governo Lula. Projetos travados, emendas desfiguradas, chantagens políticas e uma pauta conservadora imposta à força expõem a fragilidade de um governo que, apesar de legitimado nas urnas, enfrenta um campo institucional minado. Diante disso, uma pergunta angustia amplos setores progressistas: como evitar que esse cerco leve ao “mal maior”, a saber, o retorno de Bolsonaro ou de um herdeiro político da extrema direita nas eleições de 2026?
A resposta não está em fórmulas mágicas, mas em estratégia, coragem e capacidade de articulação política com o povo. O primeiro ponto é a comunicação. O governo Lula precisa urgentemente disputar o campo das ideias e das redes sociais. Não se pode mais permitir que a extrema direita continue pautando o debate público com mentiras, distorções e histeria moral. É fundamental investir numa linguagem acessível, emocional e direta, que dialogue com o cotidiano da população. A vitória de 2022 foi apertada, e um dos fatores foi justamente a hegemonia bolsonarista nas redes — hegemonia que, infelizmente, segue extremamente ativa.
Além da comunicação, é preciso reforçar a articulação política. Lula é reconhecido por sua habilidade em costurar acordos, mas o atual Congresso exige novos parâmetros. O Centrão não pode ditar os rumos do país sem limites. É necessário reorganizar a base aliada, inclusive com possíveis ajustes ministeriais, mas também com definição clara de pautas inegociáveis, como a defesa dos direitos sociais, da democracia e da soberania nacional.
A chave, no entanto, está nas ruas. O governo precisa dialogar diretamente com os movimentos sociais, sindicatos, juventudes, coletivos de mulheres, quilombolas, indígenas, catadores, artistas e educadores populares. Não se governa em clima de guerra institucional sem apoio popular. O campo democrático deve se reorganizar com força, consciência de classe e vocação histórica. É hora de retomar a pedagogia política das grandes campanhas de base, como as que marcaram os tempos da redemocratização e da Constituinte.
Outro ponto vital é a entrega concreta de resultados. A redução do desemprego e aumento do emprego formal são bons exemplos e já vêm acontecendo. Fortalecer o SUS, universalização de crianças em creches e escolas de ensino fundamental e médio, em parceria com governos estaduais e municipais, garantia de comida no prato, reaquecer a economia popular e combater a fome — isso tudo comunica muito mais do que qualquer discurso. A população precisa sentir no seu dia a dia que o governo está do seu lado. Que os serviços públicos estão melhorando. Sem isso, o discurso autoritário da direita voltará a ganhar tração, explorando frustrações e ressentimentos legítimos da população.
Também é urgente preparar o terreno para 2026. Isso significa formar novas lideranças, renovar o Congresso e disputar o imaginário popular com projetos que unam dignidade, desenvolvimento e justiça social. A esquerda precisa olhar para fora das bolhas, ir ao encontro dos que votaram em Bolsonaro por desinformação, medo ou desilusão. Ninguém será convencido com arrogância. A disputa será longa e exige humildade estratégica.
Por fim, é preciso resistir ao avanço do autoritarismo judicial, do lawfare e da criminalização da política. Os mesmos instrumentos usados contra Dilma e Lula podem ser reativados amanhã. Defender as instituições, sim, mas sem ficar refém delas. Denunciar abusos, fiscalizar as togas, exigir justiça com equilíbrio e transparência.
Evitar a volta de Bolsonaro é, portanto, um dever coletivo. Não é tarefa apenas do presidente ou de seu núcleo político, mas de toda uma frente democrática que precisa se fortalecer desde já. O futuro está em disputa. E não há espaço para vacilos.
Tarcísio, a aposta da extrema direita - A extrema direita brasileira parece ter encontrado seu novo rosto. Fora da disputa eleitoral por conta da inelegibilidade, Jair Bolsonaro já movimenta suas peças para lançar o sucessor. O nome de Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, tem ganhado força como figura de transição: alguém que carrega a marca bolsonarista, mas se apresenta como gestor moderno, técnico e disciplinado. Uma reedição de Bolsonaro com menos escândalos pessoais, mas com o mesmo projeto econômico ultraliberal e valores conservadores.
O que está em jogo, portanto, é a continuidade do projeto da extrema direita com nova embalagem. E, diante disso, a dúvida se impõe: o Brasil vai precisar, mais uma vez, de Lula como candidato para impedir esse avanço?
Lula em 2026 - Lula é, sem dúvida, o maior nome do campo progressista. Carismático, resiliente, experiente e ainda profundamente identificado com os setores populares. Sua força eleitoral se mantém viva, e caso concorra, é hoje o único nome capaz de derrotar Tarcísio em um segundo turno. No entanto, essa dependência crônica da liderança de Lula revela um problema maior: a personalização do projeto político da esquerda.
Lula tem sido, ao mesmo tempo, força e fraqueza do campo progressista. Força, porque representa conquistas reais e lembranças afetivas fortes nas camadas populares. Fraqueza, porque a ausência de lideranças renovadas deixa o projeto político vulnerável. A esquerda precisa, urgentemente, construir um novo ciclo, com base social ativa, quadros jovens, mulheres, lideranças indígenas e negras com capacidade real de disputar as massas.
Depender de Lula em 2026 pode ser necessário, mas não deveria ser inevitável. Se for, que seja por estratégia, não por falta de alternativa. Um eventual quarto mandato seria um desafio: lidar com um Congresso hostil, com um sistema financeiro pronto para sabotar, com uma mídia agressiva e com um Judiciário imprevisível. O caminho não será fácil.
Se, por outro lado, Lula decidir não ser candidato, será preciso preparar, desde já, uma liderança capaz de dialogar com o povo e herdar o seu legado político com autenticidade. Haddad, Gleisi, Boulos, Flávio Dino — há nomes em disputa, mas nenhum ainda tem a capilaridade popular que Lula conquistou ao longo de décadas. Isso só se resolve com militância, comunicação eficiente e presença nos territórios. O povo precisa reconhecer nesses nomes não apenas o apoio de Lula, mas também um compromisso concreto com suas dores e esperanças.
Por isso, o debate sobre 2026 precisa ser trazido para 2025. A oposição já está fazendo isso. Nós, do campo democrático, não podemos nos limitar à administração do presente — temos que construir desde agora a trincheira do futuro. E ela não se faz apenas com bons ministros ou indicadores econômicos; ela se faz com consciência de classe, mobilização de base e engajamento político.
Se Lula vier, que seja com um programa ousado, que enfrente os privilégios do sistema e fortaleça o povo. Se não vier, que seja como condutor de um projeto coletivo capaz de impedir a volta de um autoritarismo neoliberal. Em qualquer dos cenários, o nome de Lula ainda será central — seja como candidato, seja como fiador de uma esperança que, para sobreviver, precisa se reinventar.
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