A estranha manchete da Folha que desqualifica os ministros do Supremo
“Há um erro deliberado grave no retrato que a Folha apresenta para exaltar os 'militares' e depreciar os juízes do STF", escreve Moisés Mendes
Aconteceu agora, em junho. Pela primeira vez, um general ficou diante de um juiz no Brasil. Pela primeira vez, um general disse a um juiz, para informar de onde falava no depoimento virtual: estou preso. Pela primeira vez, um juiz respondeu a um general preso: eu sei, eu que decretei.
Foi em 10 de junho, com Braga Netto diante de Alexandre de Moraes. A Folha informa agora, 17 dias depois dessa cena transmitida ao vivo, que 58% dos brasileiros têm "vergonha dos ministros do Supremo". E que apenas 36% têm vergonha dos "militares".
O texto, baseado em pesquisa do instituto do grupo, resultou nessa manchete: “Datafolha: 58% dizem ter vergonha dos ministros do STF; 30% falam em orgulho”. A manchete provoca espanto, na primeira leitura, mas deve ser vista também pela falsa fotografia que o texto apresenta.
Primeiro, o espanto: como a instituição que enfrenta o golpismo provoca vergonha entre 58% dos brasileiros? Espante-se quem quiser se espantar.
Por que os militares, com seus líderes no banco dos réus, provocam mais orgulho para 55% dos entrevistados do que a vergonha sentida pelos 36%? Porque, diria a resposta apressada, esse é o Brasil que temos hoje.
Podemos repetir que a percepção média sobre as figuras públicas, as instituições e as coisas em geral não é mais a mesma. E aí a conversa passa a ser infindável sobre como as pessoas não percebem, com o mesmo olhar e o mesmo sentimento, o que viam há pouco tempo de outro jeito.
E agora a segunda parte. O que a Folha quer expor na chamada de capa é a “vergonha dos ministros do Supremo” sentida pelos brasileiros. No texto, quando detalha as percepções sobre Lula, prefeitos, governadores, senadores e outras figuras, refere-se a “militares”.
No gráfico, com os números de cada figura ou instituição, a palavra “militares” é substituída por “Forças Armadas”. Imagina-se que a designação militares foi a usada no texto para simplificar e tratar genericamente todos os que vestem fardas no Exército, na Marinha e na Aeronáutica.
Se a pergunta feita nas ruas e por telefone indagou sobre militares ou sobre Forças Armadas, pouco importa nesse caso, mesmo que não sejam a mesma coisa.
Os militares, diria o cabo do jipe de Eduardo Bolsonaro, fazem parte das Forças Armadas. Mas uma pergunta sobre os quadros das Forças e outra pergunta sobre a instituição pode oferecer respostas diferentes.
O que importa aqui é que, sendo militares ou Forças Armadas, não há equivalência num detalhe decisivo do texto da pesquisa. Militares e Forças Armadas não são equivalentes a “ministros do Supremo”.
Ministros do Supremo são os juízes da mais alta Corte do país e estão expostos agora a todo tipo de julgamento, principalmente pelo protagonismo heroico de Alexandre de Moraes.
Para que a imagem dos militares da mais alta patente fosse confrontada com a dos ministros no mais alto posto da magistratura, o Datafolha teria que perguntar se os generais provocam sentimento de orgulho e vergonha. Os generais, e não os que aparecem genericamente como militares no texto, são os equivalentes aos ministros do STF.
A Folha não diz que o sentimento é em relação ao Supremo, mas aos ministros. Carimbou nos ministros a “vergonha”, porque eles, os da Primeira Turma, enfrentam o golpismo. E fez média com os fardados, referindo-se à imagem dos "militares".
Todas as explicações que forem dadas podem complicar ainda mais a situação da Folha. Os generais são militares, mas é certo que hoje não representam a imagem de todos os militares. Até porque poucos militares são generais.
E o resto da pesquisa? O resto é a sopa que todas a amostragens revelam sobre os humores dos brasileiros. Inclusive essa, do mesmo Datafolha e também de junho, que nos informa o seguinte: 77% das pessoas se incomodam com o próprio odor corporal.
Algumas pesquisas e os textos que as apresentam, em ambiente de golpe permanente, também têm mau cheiro.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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